Como a Rússia antiga se defendia?

Fiodor Solntsev, Russia Beyond
De grupo de amigos guerreiros até o Exército Terrestre, antigo exército russo foi excepcional. A organização dos militares no país entre os séculos 9 e 16 é um tema complexo e pouco abordado na história popular, mas trazemos tudo sobre ele aqui!

Tempos de ‘drujína’

A forma mais antiga de formação militar russa surgiu no século 9 e se chamava “drujína”, ou seja, um bando de guerreiros experientes selecionados para o serviço privado de um “kniáz” (príncipe). No início, a “drujína” era uma comunidade unida, os membros mais próximos ao “kniáz” dividiam a mesa com seu líder e viviam no mesmo pátio com ele, como uma espécie de força de segurança. Não havia documentos relativos ao serviço, apenas acordos orais.

As primeiras “drujínas” eram pequenas e reuniam até apenas entre 200 e 300 guerreiros. O “kniáz” controlava o seu “vólost” (território leal) com auxílio da “drujína”, viajava pelo território regularmente, coletava impostos na forma de moeda, bens ou alimentos e protegia a população dos inimigos.

Mas com a ampliação das terras russas, as “drujínas” se transformavam em formações maiores, com até 2 mil guerreiros, o que levou à criação da primeira hierarquia militar. Os militares de alta patente eram chamados de boiardos e participavam do conselho militar do “kniáz”, controlando as formações de “drujína” inferiores. Alguns dos boiardos tinham suas próprias “drujínas”, ou um “kniáz” menos nobre podia servir dentro da “drujína” de um outro “kniáz” mais proeminente.

Em batalhas, os “kniázes” quase sempre estavam à frente de sua “drujína”. Essa tática obsoleta foi uma das razões pelas quais os mongóis esmagaram facilmente os guerreiros russos, matando os “kniázes” em primeiro lugar. Embora as primeiras formações militares russas contassem apenas com cavaleiros, infantaria e arqueiros, a organização e o comando eram muito simples e os guerreiros apenas seguiam os líderes e suas bandeiras.

Pode-se ler na “Crônica de Henrique da Livônia”, em trecho em que se descreve a batalha do Rio Kalka (1223), na qual uma coalizão de “kniázes” russos foi esmagada pelo exército do Império Mongol liderado pelos comandantes de guerra Jebe Noyon e Subedei: "Príncipes de toda a Rússia saíram contra os tártaros, mas não tinham forças suficientes para a batalha e fugiram de seus inimigos. O Grande Príncipe Mstislav de Kiev caiu com quarenta mil soldados que estavam com ele. Outro príncipe, Mstislav de Galich, escapou. Outros cerca de cinquenta príncipes caíram..." Mesmo aqui, a crônica descreve as forças russas não como uma potência unida, mas como uma congregação de “kniázes” separados.

Nos séculos 13 e 14, quando as terras russas dependiam do Estado mongol, as forças militares russas foram aprimoradas e se adaptaram às necessidades de realizar operaões ofensivas. Que formações permitiram finalmente derrotar os inimigos?

De regimentos das cidades até o Exército Terrestre

Entre 1228 e 1462, os guerreiros russos participaram de 302 guerras e campanhas militares. Sob o domínio dos mongóis, as terras russas foram divididas em ducados que surgiram em torno de cidades fortificadas. Cada ducado era controlado por um “kniáz” e tinha um regimento de cidade, ou seja, uma formação militar mista que consistia de cavalaria e infantaria com vários tipos de armamentos. Embora eficazes nas guerras locais entre os ducados, essas formações não eram adequadas para uma guerra maior.

Assim, os kniázes começaram a criação do Exército Terrestre, concluída por Ivan, o Grande (então, Grão-Príncipe de Moscou).

A estrutura do Exército era baseada na propriedade da terra. O Grão-Príncipe doou a seus principais auxiliares, os “kniázes” e boiardos, os direitos de controlar e tributar certos territórios. Em troca, os militares e seus descendentes homens foram aceitos no serviço militar vitalício e obrigados a servir o Grande Príncipe.

"Assim que atinjam a idade em que podem portar armas, eles aparecem no escritório do governo e se declaram; seus nomes são imediatamente incluídos no livro, e eles recebem certas terras para controlar, geralmente as mesmas de seus pais", escreveu o diplomata inglês Giles Fletcher, em 1591.

As pessoas da classe de serviço hereditário sempre foram guerreiros de cavalaria mais experientes e formavam a elite do Exército Terrestre. A infantaria consistia em fuzileiros, artilheiros, engenheiros, ferreiros e arquitetos militares que viviam nas terras pertencentes à elite e recebiam pagamentos pelo serviço. Eles foram convocados para o exército apenas durante as guerras.

A terceira grande parte do Exército Terrestre era composta de "recrutas" das terras pertencentes ao povo da classe de serviço hereditário. Eram camponeses comuns, sem experiência militar, conhecidos como servos desde o século 16. A maior parte do trabalho militar mais duro recaiu sobre eles. Os recrutas levavam armas, cavavam valas, construíam fortificações, transportavam munições e alimentos para o exército.

Exército Terrestre: administração e números

O Grão-Príncipe de Moscou, chamado mais tarde de Tsar, e seu círculo mais próximo de estadistas e comandantes militares, chamado de Duma de Boiardos, nomeavam o "bolshoi voevoda", ou seja, o grande comandante militar, que tinha “voevodas” juniores sob seu controle.

A principal instituição militar, batizada de "Razriádni prikáz", criava e atualizava as listas das pessoas que deviam servir. Eis como ficou um desses registros, do ano 1621: "Ivan, filho de Ondrêi, Ododurov. Os inspetores [de Moscou] e moradores locais disseram: bom da cabeça, servia em um bom cavalo, tinha outro cavalo simples, mas nunca teve homens servindo ao seu lado".

O "Razriádni prikáz" também foi a principal instituição judicial e controlava as finanças.

Os historiadores não sabem o número exato de pessoas que serviram do Exército Terrestre, principalmente porque quase todos os registros do “Razriádni prikáz” foram perdidos no incêndio de Moscou de 1812. Segundo estimativas, cerca de 100 mil homens serviram no exército russo no final do século 16. Há, no entanto, alguns registros fragmentados que têm números exatos. Em 1630, todo o Exército Terrestre contava com 92.555 homens. Um terço deles eram homens nobres da classe de serviço hereditário. Em 1651, o número subiu para 133.210 homens e, em 1680, para 164.600.

No século 17, o Exército Terreste passou por grandes mudanças estruturais, de pessoal e administrativas, que criaram a base para as reformas militares abrangentes de Pedro, o Grande.

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